quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Seus dedos de bailarina


Seus dedos de bailarina. Seus dedos de bailarina sobre o teclado duro e seus dedos de bailarina são tão, tão leves. Os cabelos caem sobre os ombros, coisa que não acontece quando você está dançando. Eu passo os dedos, roço nos seus cabelos. 
A música avança. Fica mais rápida. 
E então calma novamente. 
Perco a coragem. Meus dedos recuam. Você me olha com curiosidade. E deboche, aposto. Arranco o seu pescoço com as unhas. Sou violenta. Sou trágica. Gosto de ver o sangue, sangue, sangue, sangue, vinho derramado em seu peito. 
Nada mais de deboche. As linhas vermelhas. As unhas passando de novo. Ela se levanta, para de escrever e vem me dar um beijo. 
Estou com medo. Não admito, não a deixo perceber, mas tenho muito medo do que ela pode fazer com o meu coração. Meu pobre e frágil coração, imagino-o esmagado por aqueles delicados dedos de pianista. 
Que agora passam pelas minhas costas tocando e tocando, levemente, com ritmo lento. Depois com força. Depois com todo o corpo. Depois com uma música infernal, com o som do diabo, quando a saliva invade meu ouvido quando você morde lá. Quando meu corpo se mostra inteiramente nu para o mundo (o meu quarto). 
É o diabo. Mulher, tu és o diabo. Diabo de olhos de virgem. De dedos calmos e então vigorosos e apressados. De dedos de pianista. Diabo de dedos frágeis que param. 
Então vêm os meus. Os meus são frágeis de verdade. Não dedos de pianista. Ou de bailarina. Dedos meus, dedos trágicos. Dedos frágeis de medo. 
Eu não deixo transparecer, nunca, nunca, mas estou com medo de você, Misune. Mulher-diabo, Deus-bailarina, dedos de inferno. Te toco, mesmo com dedos trêmulos. Sei que tenho que te satisfazer. Quero te satisfazer, quero mais que tudo. 
Quero vender a minha alma para você, Misune. Quero que faça dela o que quiser. Um dia, quando me acostumar aos toques dos dedos e de todo o resto, talvez eu também te dê meu corpo. 
Agora não. Afasto-me de você como se você queimasse. E queima. Ah, queima. 
Você pergunta o que foi? e eu digo nada, não foi nada. Não foi nada. Eu me sento na cadeira em frente ao computador, desviando os olhos de você. Começo a ler o que você estava escrevendo, mas não absorvo muita coisa. Sei que era sobre mim. Sei que você me ama, Diabo. Mas ainda não posso me entregar. 
Olho para você a última vez aquela noite, pego em seus dedos de bailarina uma última vez. Meus dedos são tão brancos em comparação aos seus. Não brancos de cor. Brancos de pureza. Os seus já se arrastaram por tantos cantos, tantos corpos. Consigo ver as suas unhas sujas, impregnadas de paixão. 
Meus dedos são puros. Acaricio o seu pulso, seguindo as veias bem verdes. Meus dedos de anjo. Não posso ainda, Misune. Não me permito. 
Ainda és um demônio.

Um comentário:

  1. E, entregando-nos com mais vigor aos demônios. Ousadia apraz a humanidade.

    Adorei conhecer também este blog, abraço!

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